29 de maio de 2015

Puro humo*


Qualquer fumador de charutos, seja ele mais ou menos regular, tem, no espaço ibérico, um profundo respeito reverencial pelos puros cubanos. E os habanos são, de facto, especiais. O terroir, a folha, a mestria, as mitologias, tudo contribuiu para o seu estatuto intocável.

O facto de a empresa de tabacos espanhola ocupar uma posição privilegiada na sua congénere cubana e ser sujeita a uma carga fiscal diferente da nossa, permitiu durante muito tempo que o país vizinho beneficiasse de preços excepcionais. Era possível ir a Espanha comprar caixas de charutos, ou até encomendar pelo correio.

Porém, o tempo de ter em casa, para dar um exemplo sublime, uma caixa de Torpedos Sancho Panza, acabou, pelo menos para uma boa parte dos apreciadores. O fumador de charutos também tem sofrido amargamente com a fiscalidade lusa e com a crise. Agora, com a reaproximação dos EUA com Cuba, as coisas vão certamente piorar. Os charutos cubanos serão certamente mais caros e cada vez mais raros.

Em contrapartida, esta situação fez com que pudéssemos descobrir os mercados alternativos, e cada vez mais importantes, da produção sul-americana. Desde logo, as produções da República Dominicana, para onde alguns dos antigos produtores cubanos se mudaram depois da revolução. Mas, hoje, muitos outros países produtores se impõem pela qualidade. É o caso da Nicarágua, que começa a marcar uma presença muito forte no mercado internacional.

Destacamos aqui o caso dos charutos Oliva. Reza a história que Melanio Oliva foi produtor de tabaco em Cuba, desde 1886, tendo participado inclusivamente na guerra de independência, sendo a produção, posteriormente, dirigida pelo seu filho. Após a revolução e o domínio comunista, o neto Gilberto acabou por fixar a produção na Nicarágua a partir de sementes de tabaco cubano, tornando-se o segundo maior produtor daquele país. Vale a pena explorar o universo Oliva, de que continuaremos a falar aqui.



*Puro humo é o título de um livro fundamental do escritor cubano Guillermo Cabrera Infante (1929-2005).

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